terça-feira, 16 de agosto de 2016

Os fascistas não matam gente nas praças de touros ao Domingo, dia santo



(Em memória dos cerca de 4000 mártires republicanos, sumariamente assassinados por fuzilamento na praça de touros de Badajoz, pelas forças nacionalistas-fascistas do general Franco, às mãos do odioso general Juan Yagüe, em 16 de Agosto de 1933, um mês depois do começo da guerra civil espanhola. Nenhuma das vítimas — homens, mulheres, velhos e juvenis foi julgado, sequer ouvido por um tribunal)


Os fascistas não matam gente nas praças de touros
ao Domingo, dia santo


Não era Domingo em Badajoz.

Os fascistas não matam
gente nas praças de touros
ao Domingo, dia santo.
Nem ao domingo
ali se sangram almas.
Mesmo fuziladas.
Tu sabias o que era estar ali
no dia dezasseis de Agosto
de mil novecentos e trinta e três.
Tu sabias, naquela arena,
nos corredores daquela praça
sob as bancadas, sol e sombra
e paredes de caliça e pedra
e uma praça inteira e despida,
sem olés nem flores
só o medonho urro bárbaro
dos bárbaros.

Não era Domingo em Badajoz.

Os fascistas não matam
gente nas praças de touros
ao Domingo, dia santo.
E tu estavas ali, lado a lado,
ombro a ombro,
companheiro ao pé do companheiro,
quem sabe, de mãos dadas
numa transfusão imensa
de suor e tanta coragem,
duma mão para a outra mão
apertadas como que dizendo:
Vê, estamos aqui, unidos,
aqui de pé e cada um
mais que um homem,
mais que a própria liberdade:
a liberdade toda em nós
à espera da metralha!
Vê os nossos peitos moribundos
vê como ardem exposto assim,
abertos ao sol de Agosto
ou, quem sabe, mais logo,
iluminados pelo brilho
esplendoroso e frio do luar
e pelo clarão, rápido e cobarde
das balas assassinas.

Não era Domingo em Badajoz.

Os fascistas não matam
gente nas praças de touros
ao Domingo, dia santo.
Não. Não é aqui o nosso lugar,
não é esta a nossa terra
nem na espúria arena de Badajoz
uma bala assassina matará
em cada um de nós a liberdade.
Neste dia dezasseis de Agosto
de mil novecentos e trinta e três
são outras as nossas trincheiras
e por toda a parte outras arenas,
outras praças, tantas ruas e lugares
e outros os combates por travar.
Nunca  sairemos daqui mortos
porque a razão nunca morre
nem se curva perante a tirania,
que aqui agora é o eterno lugar
dos nossos sonhos todos
derramados, semeados nesta terra
com o perene odor do sangue quente
e da coragem contra a besta.
Nesta arena que renascida um dia
frutificando do sangue, incendiará
esta praça plena de memória
que será, aqui, ali, em toda a parte
uma praça em Badajoz
no mundo inteiro.

Dezasseis de Agosto
de mil novecentos e trinta e três.
Os fascistas não matam
gente nas praças de touros
ao Domingo, dia santo.

Era sábado em Badajoz.



António F. Martins


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