segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Madrugadas (Poemas acerca de tudo)

Madrugadas
(Poemas acerca de tudo)


Em cada madrugada,
por entre os silêncios
dos sonos e dos sonhos
e o agitar do vento norte
rompendo a surda calmaria,
adormecem serenas as searas
e caem mortas, nos regatos
as primeiras aves da manhã.

Em cada madrugada,
nascem e crescem as sombras
e das sombras o medo
que gela o sangue e o ódio
nos rios lamacentos
que correm pela cidade,
sem luz, por dentro de nós
e pelos nossos, tão nossos
ermos escuros.

Em cada madrugada
há um compasso incerto
de certezas que eu não sei,
de inquietações que não desvendo
e uma noite plena de silêncios
que do silêncio da noite
os gritos se não ouvem.
E há um relógio que não para
e há um sol que se não vê
e há um menino que dorme
acordado no colo da sua mãe.

Em cada madrugada
e no seu espaço
pode nascer uma flor
crescer e morrer
e cumprir-se assim inteira a noite
adormecida em si mesma
numa qualquer rua da cidade,
numa esquina ou numa cama
com lençóis de seda e sem amor.
E, lá fora, uma lua, sempre uma lua
em discretas vigílias,
perscrutando atenta, no escuro,
os silêncios, os sonos e os sonhos.

Em cada madrugada
não é só a noite e a sombra
ou o silêncio e a angústia
de inusitadas paixões
ou de amores oferecidos,
comprados, vendidos
ou encontrados nos copos cheios
de vidas às vezes tão vazias.
Em cada madrugada
é também o tempo da espera
de quem espera na noite
o acontecer de cada noite
e, em cada noite espera
a madrugada chegando
e partindo a qualquer hora.

Talvez sempre à mesma hora.



AntónioFMartins

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