De
Alcácer Quibir e não voltei
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
de
Afonso, rei primeiro
erguido
em São Mamede
do
colo agreste de sua mãe
e
do aço afiado da espada
que,
temperada na forja
assim
forjou uma nação
maior
que a História
a
terra toda, os mares imensos,
mais
que um rei ali então adivinhara.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
da
História que trago viva
correndo-me
nas veias
há
quase mil anos,
perdido
e encontrado nos ventos,
galgando
as terras e as marés
do
sul, ao norte, em todo o mundo,
correndo
na garupa inquieta dum ginete
ou
navegando na proa arribada duma nau.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
do
pinho, da nau e do mastro,
da
vela latina aos sete ventos
em
oceânicas bolinas
pelas
desconhecidas distâncias
que
tantas vezes achando,
em
mim, aqui, tantas vezes se perderam
em
cada partida e em cada chegada.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
de
conquista em conquista,
empunhando
lado a lado a espada e a cruz,
às
vezes naufragando no escorbuto
ou
emergindo dos fundos oceânicos
levantando
na mão um poema à tona da água
e
nela tantas vezes morrendo de sede
por
entre as vagas, a espuma e tanto oceano.
E,
lá longe, na pátria, toda a pátria à minha espera.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
dos
lados todos do mar
sem
margens, sem rumo, marinheiro
amarrado
aos mastros da distância,
navegando
numa nau feita de ventos
e
ondas e sal e mundos novos
ou
atraído pelo canto das sereias
saídas
dos sonhos, das tempestades
ou
encalhado em cada proa do destino.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História,
das
vastas vastidões por encontrar,
dos
mares todos às terras que não sei,
dos
continentes que não eram ainda continentes,
dos
mares distantes ainda mares por nomear
e
onde morri e renasci nas neblinas
numa
nau ou no dorso dum cavalo lusitano,
correndo
em fúria no meu sangue
derramado
nas memórias da memória
de
Alcácer Quibir e não voltei.
Eu
venho lá de trás
do
princípio da História.
António
F. Martins
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