terça-feira, 23 de junho de 2015

Chamas-me e eu aqui (Escrevendo acerca de tudo)

Chamas-me e eu aqui

Chamas-me rio e mar
e queres-me aqui.
O teu corpo
o teu sangue
ao pé de ti.
Chamas-me, queres-me
e eu aqui.

Queres que eu seja
a serra, o vale e a planície
a tormenta e a bonança
o gesto, o feito e a espera.
Um país inteiro
e as sombras sombras
e eu aqui.

Chamas-me árvore, prado,
fonte, rouxinol, um riacho
e eu respondo-te
ficando aqui
como se fica a um pôr do sol
que não acaba nunca
e eu aqui.

Chamas-me rio e mar
e marinheiro
e gaivota e navio
e eu já não sei dizer-te
porque não me vou
se navego ou estou perdido
e eu aqui.

Chamas-me país
e eu dou-te aldeias
e terras e lugares
o mar da calma
e as tempestades
e as gentes daqui
do longe e do perto
e eu aqui.

Chamas-me país
e eu não sei se sou porto
se sou foz
se sou naufrágio
ou serena baía
encalhada neste destino
e eu aqui.

Chamas-me país
e eu olho-te
e encontro-te
entre espuma e algas
na baixa da tua maré
de desejo e beijos
e eu aqui


Chamas-me país
mas tu nem sabes sequer
agarrar os dedos desta chuva
que te escorre do olhar
e em ti escreve
palavras por dizer.
e eu aqui

Chamas-me país
e gritas ao vento
e às ondas
que te deixe
e eu não te deixo
e não te sinto
e eu aqui

Chamas-me país
e o tempo vai-nos tirando
a terra e a gente
e o verde e o mar e as ondas
que em vão em ti se espraiam
acabando sempre por deixar-te
e eu aqui

Não me chames mais.
Não há já ventos
que levem o teu grito
onde se perdeu a tua alma
e a tua voz perdeu-se
nas tuas veias secas.
Já não estou aqui.


AntonioFMartins

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