domingo, 23 de agosto de 2015

Ali, às Belas Artes (Escrevendo e desenhando por Lisboa)


Ali, às Belas Artes
((Escrevendo e desenhando por Lisboa)



É aqui,
onde quase toco o Chiado
que eu vou sair
da matinal pachorra
do eléctrico
que se arrasta
de colina em colina
pela cidade.

Talvez
nem espere pela paragem
um pouco mais adiante
e saia mesmo
em andamento.
Uma corrida
e entro esfalfado,
um pouco mais acima,
em Belas Artes.

Todos os relógios
me apontam firmes
os ponteiros
e me gritam o atraso.

Um minuto mais
e estarei sentado
em frente ao cavalete,
a olhar talvez
um engessado Herodes Agripa
e a riscá-lo a carvão
numa qualquer
folha branca
de papel Vergé .

Aqui,
onde já foi lugar do divino
— o Convento de São Francisco
que o terramoto de 1755
sacrilegamente arrasou,
é, desde 1836
ainda o divino
que por cá se mantém,
traduzido desde então
na magnífica ensinança
das mais belas
das Belas Artes. 

Logo, o eléctrico,
pachorrento,
vai levar-me de novo. 

Por agora,
Agripa, muito branco,
do alto do seu engessado olhar,
enfastiado,
pede-me que continue
o meu desenho.



AntónioFMartins


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